domingo, 30 de agosto de 2015

El Chupe de camarones: a rainha das sopas do Peru

Eu adoro sopas. E tem dias, que uma sopa é a única coisa que serve para me confortar. Muitas vezes, achamos que este tipo de preparação trata-se de, apenas, um grande misturado de ingredientes e esquecemos, muitas vezes, importantes historias por trás dos preparados, que influenciaram determinada cultura e carregam o prato com uma força inigualável. Pesando nisso, hoje resolvi falar de uma sopa (sei que vai ter gente que não gosta de sopa torcendo o nariz) que eu adoro: el chupe de camanones.


El Chupe é uma sopa típica de Arequipa, no sul peruano, el chupe de camarones é uma preparação das que mais gosto, daquela região: talvez, pelas cores, pela energia que me dá – mas, certamente, pelo delicioso sabor. El chupe nada mais é do que sopa de camarões, de origem mestiça, já que sua origem está enraizada com a chegada dos colonizadores espanhóis.

A receita da sopa nos faz lembrar à bisque de camarão, uma sopa francesa com manteiga, creme de leite e conhaque; e ao "chupi", um guisado que existia nestas terras desde tempos pré-hispânicos. O resultado, uma feliz e deliciosa descoberta, que veio com adaptações: obviamente, os Incas tinham suas sopas e ensopados, mas os espanhóis adicionaram outros ingredientes nessa mistura. Essa sopa começa a ter registro apenas no início do século 19, na região de Callao. No entanto os camarões de Arequipa, símbolo daquela região, deixou a receita ainda mais conhecida. Inicialmente, essa sopa era consumida em casa, nos fins de semana, mas pelos idos de 1950 a 1970 tornou-se popular nos restaurantes.


El chupe pode ser preparado com carne bovina, cordeiro, frango, peixe e camarão, batatas, cereais, legumes como abóbora e batata-doce, cozidos e acompanhado por uma pasta feita com alho, cebola, pimentão e especiarias - sua versão mais primitiva só incluía batatas, pimentões e ervas. Mas com a chegada dos espanhóis arroz, queijo, ovos e leite foram introduzidas. Para chupar você pode adicionar carne bovina, cordeiro, frango, peixe e camarão.

O termo chupe, deriva de um nome hispanizado de um antigo ritual peruano. Diz uma antiga lenda peruana que, quando os filhos dos chefes guerreiros atingiam a puberdade (entre 13 e 14 anos) eram submetidos a jejum como parte de treino de guerra. Durante 15 dias, os jovens não podia comer outras coisas que não fosses, bolos de farinha de milho, chicha (um refresco feito de milho roxo) ou água alimentos. E, culminando a proeza, donzelas eram escolhidas e aproximavam-se deles com as partes intimas untadas com uma substância feita a base de tomate, pimenta, cravo de defunto e outras ervas como muña, para que os rapazes chupassem. Esta cerimónia era chamada Chupe, pelo ato que o rapaz exercia, e significava que o jovem tinha deixado a inocência, ido para a realidade do prazer humanos, estando pronto para ser um guerreiro.


Felipe Mejía, autoridade no estudo da cozinha peruana, em seu livro "De cocina peruana, Exhortaciones", Afirma que o camarão foi um dos primeiros alimentos dos peruanos, sua carne delicada e saborosa era de uso exclusivo de reis incas. Se pescava a milhões de anos e para sua extração os antigos peruanos se valiam de uma espécie de rede chamada atarraya, assim como cesta de cana, chamadas izangas.



Os primeiros Chupes de Camarones receberam o nome quechua de Chuwa Masi, que significa "sopa amiga" ou "sopa companheira de festa".  Muitas pessoas dizem que não existe sopa peruana mais bonita que esta, mas sabe-se que não há região peruana que não tenha el Chupe, porque a preparação foi herdada da cozinha dos Incas, que saboreavam o preparado feito por Kery Awicha, a deusa da cozinha Inca, que tinha o encargo de "cozinhar para preencher a alma e depois o estômago."

Talvez, a culinária peruana me encante mais ainda, por ter sempre a mitologia para lhe dar misticismo. Não bastasse a imaginação reproduzindo uma cena da deusa inca da cozinha preparando el Chupe, mas há uma lenda que explicaria todo o encanto e sabor inigualável que tem a comida peruana. Fico sempre contente quando encontro preparações que, a partir dos saberes antepassados, as pessoas sempre buscaram o melhor – em todos os sentidos.

Em todas as mitologias conhecidas pela história existe sempre um mensageiro dos deuses. Esses personagens importantes do mundo mitológico têm certas características semelhantes: são seres geralmente amigáveis, simpáticos, bem desenvolvidos na sociabilização, extrovertidos, sensíveis, qualidades essas que em conjunto lhe permite ganhar a confiança de deuses e homens.

Na mitologia peruana não seria diferente. No entanto, aqui o mensageiro dos deuses não tem forma humana, mas de ave, mais exatamente um beija-flor (colibri), e tinha características similares aos demais mensageiros mitológicos: inteligência, simpatia, sociabilidade, mas o mensageiro dos deuses peruanos, Chiwake, tem ainda mais estilo, como pronunciarei com base em uma lenda extraída da tradição oral da região Sul peruana, exatamente de Nasca, e tem cerca de 2.500 anos de tradição.


Certa manhã de um rigoroso inverno, os deuses estavam reunidos formando o antigo Peru, decidiram atender aos pedidos dos homens que solicitavam maior quantidade e qualidade de alimentos. Os deuses enviaram com Chiwake, o mensageiro divino, um caldeirão mágico de onde sairiam as mais deliciosas sopas já conhecidas. 

Mas Chiwake era Travesso e brincalhão e acabou perdendo pelo caminho o tão afortunado presente. Com remorso pelo descuido, se apresentou ante os homens e lhes disse que os deuses queriam que ele mesmos preparasse seus alimentos e lhes ensinou como escolher cada ingrediente, como combinar sabores e aromas de mil maneira diferente e apresentá-los com elegância e harmonia. Desta maneira, os peruanos aprenderam a cozinhar com a mesma arte e tecnologia dos deuses. Isso explicaria por que a comida peruana tem tanto sabor, já que aprenderam o oficio com o representante divino, e assim, pode-se dizer, que cozinham como os deuses.

. Assim, se construiu a história peruana desde os tempos pré-Inca, com conceitos mágicos e religiosos que fizeram nascer as primeiras opiniões sobre as leis da natureza. Em todo o antigo Peru foram surgindo inúmeros deuses, os bons se unem a vida, a saúde, a alimentação, os maus a enfermidade e a fome. Começou-se a relacionar sistematicamente vida e morte com fenômenos naturais, por exemplo o dia e o calor são associados com a saúde e o positivo, e a noite e o frio com a enfermidade e o negativo.


Os deuses enviavam espíritos malignos para pegar os corpos designados por má conduta, geralmente por terem um juízo passional. Para contrariar esta energia negativa existiam os deuses que protegem a natureza, alimentam a evolução, alimentam e se encarregam de curar o corpo humano.

Alguns personagens muito importantes, ao longo da história têm sido os magos, feiticeiros, curandeiros e sacerdotes, com diferentes características, nomes e graus de aprendizagem - mas com um denominador comum, muito especial - eram os intermediários do divino na terra. Representam o veículo de comunicação entre a triste realidade do enfermo, do faminto, do amor não correspondido, da esperança de cura, da satisfação, mediante os poderes supremos que poderiam transformá-los a uma simples vontade.  Este esquema básico teve grande importância no âmbito social, político e econômico. Tais personalidades se encarregaram de concentrar em uma elite exclusiva de conhecimento e práticas referentes a atividades dedicadas a recuperação da saúde e da alimentação do corpo e da alma.


As cerimônias e ritos foram melhorados pela adição de simbolismo e protocolo, que misturam sonhos e realidade com a firme intenção propósito de ocultar, de maneira sistemática, as evidências naturais encontradas como causas, para enfatizar apenas os aspectos mágicos e religiosos, transformando-os em instrumentos de grande poder. Sempre a atitude humana sempre foi fundamental para enfrentar doença e desespero. Com o mesmo conceito e realidade, no mundo da gastronomia, atitude, personalidade, cultura e simpatia do chef influenciam na magia que envolve uma boa mesa, sem dúvida, o sabor, aroma, textura e cor são presentes dos eternos deuses do bem.

Bom, agora que a historinha foi contada, que tal preparar essa sopinha deliciosa. Garanto que você vai viciar. E, quando for ao Peru, não esqueça de provar el Chupe original.

Chupe de camarones

½ quilo de camarão
4 batatas inglesas
2 ovos
1 espiga de milho cortada em pedados
¼ xícara de favas ou de ervilhas
¼ xícara de arroz
1/2 xícara de leite
½ xícara de queijo (do seu gosto, mas queijo prato fica muito bom) em cubos ou ralado
1cebola
1 tomate
1 colher de chá de alho picado
2 colheres de sopa de pimenta-aji (uma pimenta tradicional peruana, mas coloque a que tiver)
¼ xícara de óleo ou azeite
1 colher de sopa de manteiga
Um raminho de Huacatay (uma erva tradicional peruana parecida com a hortelã, na falta use esta última), hortelã, orégano, salsa, pimenta do reino, sal a gosto.
4 xicaras de agua

Preparo: Lave os camarões, retire a casca (reserve as cascas), e os doure com a manteiga. Reserve. Prepare um refogado com cebola cortada em cubos, o alho, tomate, pimenta-aji e pimenta do reino. Incorporar as quatro xícaras de água e a casca do camarão e deixe ferver bem, em seguida, retire as cascas dos camarões. Adicione o milho, as favas ou ervilhas, as batatas picadas e o arroz. Depois de cozido, adicione os camarões, orégano e sal. Ferva até camarão mudar de cor (deve ficar rosado). Em seguida, escalfar os ovos (deixá-los mergulhados ou ir banhados com o caldo para que cozinhem), o queijo ralado ou em cubos e um raminho de huacatay (ou a hortelã) hortelã. Fora do fogo, removeu o ramo huacatay e adicione o leite. Sirva polvilhado salsa.

domingo, 9 de agosto de 2015

O Delicioso bolo de guerra da Cruz Vermelha (Red Cross War Cake)


Certamente a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) foi o grande divisor de águas desta era, a "guerra para acabar com todas as guerras" começou com o assassinato do arquiduque Ferdinando da Áustria e da Grã-Duquesa Sophie, na Sérvia em 1914. Os homens de infantaria dos EUA, conhecidos como "Doughboys", chegam na frente ocidental, no verão de 1917 - os Estados Unidos tinham indo fornecer aos aliados britânicos, franceses, belgas suprimentos alimentares para dois anos.
Os soldados norte-americanos eram muito bem provisionados em comparação com seus companheiros aliados, graças ao desenvolvimento de padarias de “campo” conseguiram oferecer comidas quentes e frescas no front. Pequenos, os carrinhos-vagão de comida, levavam para as trincheiras a comida quentinha preparada atrás das linhas de frente.
Infestados de ratos e outros animais nocivos, sujeitos a ataques com gás venenoso e bombardeios, cheias de frio e lama gordurosa, as trincheiras era experiência única e angustiante para o Doughboys, muitos deles acostumados com o ar fresco das fazendas nos Estados Unidos.


Trabalhadores da Cruz Vermelha e tropas Americanas na Primeira Guerra Mundial, na França, 1918. Crédito: Arquivo Nacional dos EUA.
A chegada de alimentos cozidos, junto com doces, produtos lácteos, pão fresco e macio foi muito apreciado mas incongruente no inferno conhecido como guerra de trincheira. Assim, tinham ainda outro desafio: manter os alimentos secos, limpos e longe de ratos. Outro problema conhecido era a segurança das linhas de abastecimento, que sempre foram alvos de bombas e outros tipos de sabotagens – isso sempre dificultou a alimentação de tropas. 


Nas trincheiras, cada soldado carregava provisões de emergência contendo 12 onças de carne enlatada ou bacon fresco, café moído, açúcar, tabaco e papel para cigarros (e mais tarde, cigarros pré-enrolados).
O Exército comprava carne enlatada francesa, rotulada de "Madagascar" e prontamente apelidado de "carne de macaco" pelos americanos em desgosto. As “Reservas de ração" foram projetadas para sustentar as tropas quando as linhas de abastecimento estivessem impedidas, ou quando eles estivessem muito longe dos depósitos de suprimentos.


Na França, os soldados eram alojados em relativa segurança antes e depois seu serviço nas trincheiras, tendo acesso confiável à alimentação – recebiam até mesmo pacotes de comida (dentre outras coisas) vindos de casa. Obviamente, alimentos enviados dos Estados Unidos tinham que permanecer comestível sem nenhum cuidado adicional, e mesmo quando estavam velhos ou desintegrados, qualquer alimento enviado por seus entes queridos sempre foi particularmente apreciado.
E foi no ambiente rude da Primeira Grande Guerra que uma aparição doce surgiu para alegrar o menu dos Doughboys: o bolo de guerra da Cruz vermelha.


Durante a Primeira Guerra Mundial a Cruz Vermelha realizou um trabalho humanitário que incidia não apenas no transporte e atendimento aos feridos nos campos de batalha. Os voluntários transportavam correspondências entre os soldados e suas famílias, levantava fundos para os hospitais que recebiam os feridos e inválidos, ajudavam a reunir famílias separadas pelo conflito e garantiam que a comida enviada pelas famílias chegasse aos soldados.



Uma das várias receitas divulgadas pela Cruz Vermelha Americana era a de um bolo que poderia chegar ao front ocidental ainda fresco. Sem leite ou ovos, e feito com gordura vegetal no lugar de manteiga, o bolo leva ainda frutas secas embebidas em rum ou suco de laranja, o que ajuda a manter a umidade dentro da massa por mais tempo.
A receita aqui apresentada é uma adaptação do historiados e chef Libby O’Connel a partir de publicações da Cruz Vermelha durante o período da Primeira Guerra. A receita foi testada por ele para o History Channel e por mim, e afirmo: trata-se de um bolo de fácil preparo e delicioso. Experiemente!

Red Cross War Cake

1 xícara de suco de laranja ou de rum
230g de uvas passas picadas deixadas de molho em suco de laranja ou rum por algumas horas ou por uma semana.
2 xícaras de açúcar mascavo
1 xícara de água quente
1 colher de sopa de banha ou gordura vegetal
1 colher de chá de sal
1 colher de chá de canela em pó
1 colher de chá de cravos em pó
100g de nozes picadas
1 colher de sopa de raspas finas da casca das laranjas
3 xícaras de farinha de trigo
1 colher de chá de bicarbonato de sódio (Ou fermento em pó)

Preparo: Deixe as uvas passas de molho na laranja ou no rum por algumas horas. Drene o suco. Aqueça o forno a cerca de 250ºC. Em uma panela larga, leve ao fogo a água, o açúcar, a gordura, o sal, a canela, o cravo, as nozes de sua escolha, as passas e as raspas de casca de laranja. Mexa constantemente até ferver e depois deixe cozinhar com a panela fechada por 5 minutos. Retire do forno e deixe esfriar. Em uma tijela larga ou bowl, peneire duas vezes a farinha de trigo com o fermento ou bicarbonato. Adicione o líquido cremoso da panela e misture bem. Você terá uma consistência parecida com a massa de um pão. Unte duas formas de pão generosamente, preencha até a metade com a massa e leve para assar por 45 min ou até o teste do palito. Para servir, pode-se polvilhar açúcar de confeiteiro por cima. Obs.: incluir 75g de cacau em pó na receita deixa tudo mais gostoso.